quinta-feira, 28 de maio de 2015

Datisa obteve contrato da Copa América quatro dias após ser criada


Empresa, que teria pago propinas por acordo, está no centro de acusações a Marin e tem como sócios empresários influentes do futebol argentino

Por Zurique, Suiça

reprodução Taffic corrupção dinheiro FIFA (Foto: Reprodução)reprodução Traffic corrupção dinheiro FIFA (Foto: Reprodução)
O relatório do Departamento de Justiça dos Estados Unidos, que deu base para a prisão de sete pessoas em Zurich, entre elas o ex-presidente da CBF José Maria Marin, aponta um esquema de pagamento de propinas relacionado à cessão dos direitos comerciais sobre as quatro próximas edições da Copa América (2015, 2016 - edição especial do centenário, 2019 e 2023). No centro desse esquema está a empresa Datisa S.A., com sede no Uruguai, criada em 2013 por executivos de três outras empresas: a Traffic, a Full Play Group e a Torneos y Competencias. Em nome da Datisa, foi registrada uma marca, "We Match", utilizada para negociação dos direitos da competição. A empresa teria obtido, segundo as autoridades americanas, o contrato pelos direitos de exploração da competição meros quatro dias depois nascer.

Segundo a investigação, a Datisa S.A. foi criada em 21 de maio de 2013, através de um acordo entre a Traffic, a Full Play Group e a Torneos y Competencias, ambas da Argentina. A sede da Datisa é registrada em Montevidéu. A Full Play pertence a Hugo Jinkis. Ele e seu filho Mariano, vice-presidente da empresa, foram indiciados na investigação. A Torneos y Competencias tem como acionista principal Alejandro Buzarco, também indiciado, e tem como principal atividade a transmissão de eventos esportivos. Ele teria estreita relação com o ex-presidente da Federação Argentina de Futebol e ex-vice de finanças da Fifa, Julio Grondona, que morreu em 2014, e sua empresa tem os direitos de exploração comercial dos amistosos da seleção argentina. A Full Play é uma empresa de marketing esportivo fundada em 1998. 

A nova empresa, Datisa, nasceu de um racha entre a Traffic, que detinha os direitos sobre a Copa América até a edição de 2011, e a Conmebol, que decidiu assinar um acordo para as quatro edições futuras com a Full Play, segundo o relatório americano. A Traffic então entrou com uma reclamação na Flórida, foro determinado para arbitrar sobre divergências, alegando quebra de contrato. Um ação judicial foi impetrada pela empresa de José Hawilla, que segundo o relatório teria se encontrado diversas vezes com os executivos das duas companhias argentinas para entrar em acordo, dividir os direitos e encerrar o processo. Foi decidida a criação de uma nova companhia, a Datisa S.A., e cada uma das empresas ficou com um terço da sociedade.
imagem Datisa - 2 (Foto: globoesporte.com)imagem Datisa - 2 (Foto: globoesporte.com)


Segundo a investiação, representantes das empresas argentinas avisaram a Hawilla que já tinham acordado o pagamento de propina a membros da Conmebol para garantir os direitos sobre a Copa América. E pediram que ele "colaborasse" com US$ 10 milhões, pagamento com o qual o executivo da Traffic concordou, entendendo, segundo o relatório, que seria usado para as propinas. No dia em 25 de maio de 2013, quatro dias depois de sua fundação, a Datisa, em uma reunião em Londres, na Inglaterra, obteve os direitos exclusivos sobre as edições da Copa América de 2015, 2016, 2019 e 2023. 

A primeira acusação contra Marin é relacionada a essas próximas quatro edições da Copa América e envolve a Datisa, criada, de acordo com o relatório americano, para pagar as propinas. Segundo a acusação, Datisa pagaria até US$ 110 milhões em subornos (cerca de R$ 340 milhões) para garantir os direitos das quatro edições da Copa América e, deste montante, já teria pago cerca de US$ 40 milhões divididos entre os dirigentes. O contrato com a Datisa foi assinado pelos três sócios da empresa e 12 membros da Conmebol, também membros da Fifa, segundo o relatório americano.

Esse dinheiro seria distribuído assim: por cada edição, os presidentes da Conmebol, da CBF e da AFA embolsariam US$ 3 milhões cada (R$ 9,6 milhões) e os presidentes de outras sete confederações sul-americanas, não identificadas no documento, levariam US$ 1,5 milhão cada (R$ 4,7 milhões). Como restam oito confederações (Bolívia, Chile, Colômbia, Equador, Paraguai, Peru, Venezuela e Uruguai), não é possível apontar quais presidentes teriam recebido a quantia. Ainda sobrariam US$ 500 mil (R$ 1,6 milhão) para um décimo-primeiro dirigente não identificado. A soma desses valores totaliza os US$ 20 milhões apontados na acusação. 

Segundo os investigadores americanos, as duas primeiras "cotas"  (pelo acordo e pelo torneio de 2015) foram pagas. A Copa América do Centenário (que celebra 100 anos da competição) e será realizada nos EUA traria mais dinheiro - e propina maior: US$ 30 milhões (R$ 96 milhões) a serem divididos. Ou seja - segundo os investigadores, Marin teria recebido pelo menos US$ 6 milhões (cerca de 19,2 milhões) até agora pela Copa América. 

Em seu blog, Kleber Leite, ex-presidente do Flamengo e dono da Klefer, afirmou ter recebido representantes do Ministério Público e da Polícia Federal do Brasil, em cooperação com as autoridades americanas, alegando ter fornecido todos os documentos requisitados. O cartola explicou:

- Como tinha um bom relacionamento com J. Hawilla (Traffic), Hugo Jinks (Fullplay) e com os presidentes das Federações, acabei sendo a pessoa que uniu as partes litigantes neste imbróglio da Copa América e, depois de inúmeras reuniões, houve o acordo para que a Traffic retirasse a ação na justiça americana, sendo formada uma sociedade composta por Traffic, Fullplay e TyC (Torneos y Competencias), empresa argentina de comunicação, sociedade esta que passou a ser a detentora dos direitos da Copa América. Na realidade, juntei as partes e promovi o diálogo. A Klefer, empresa da qual sou sócio, não tinha, como não tem, nenhum interesse comercial ou relação com a Copa América  - afirmou.