sexta-feira, 16 de agosto de 2013

A problemática dos crimes contra humanidade abriram painel da Semana da Verdade



Site da OAB/PR



A gravidade dos crimes contra a humanidade e a problemática das leis de anistia marcaram os debates do primeiro painel do evento "Resgate da Verdade, Memória e Justiça", promovido pela Comissão da Verdade da OAB Paraná. O painel “Justiça transicional como superação do legado autoritário” aconteceu na noite da última quarta-feira (14), no auditório da Seccional e contou com a participação do jurista espanhol Baltasar Garzón.
Para Baltasar Garzón, as Comissões da Verdade têm um efeito reparador e restaurador em si mesmas. “Instituir comissões da verdade é o mínimo a ser fazer. Depois se discute como formá-las, mas para mim é importante que tenham transparência e contem com a participação das vítimas”, disse. Sem poupar críticas ao seu próprio país, Garzón comentou que a Espanha fechou qualquer possibilidade de justiça e de reparação às vítimas da ditadura franquista. A lei de anistia espanhola foi omissa em relação aos crimes daquele período. “Uma lei de anistia não pode amparar a impunidade de crimes contra a humanidade”, afirmou. 



Nesse sentido, Baltasar Garzón felicitou os movimentos que ocorrem no Brasil e em outros países do continente, citando exemplos bastante positivos, como o da Argentina e do Peru, que “abriram as portas da justiça”. “Defendo com veemência tudo o que se passa na América Latina, porque aqui estão sendo dados passos muito importantes”.  Garzón destacou que a Justiça penal não é a única solução e que devem ser buscadas outras formas de reparação integral, que tenham por base os direitos humanos das vítimas. Para o jurista espanhol, atos como o debate promovido pela Ordem dos Advogados já representam uma forma de reparação.
O presidente da OAB Paraná, Juliano Breda, abriu a noite lembrando a luta permanente do ex-presidente da Seccional, José Rodrigues Vieira Neto, contra o autoritarismo, a violência ditatorial, o sequestro dos direitos fundamentais, a brutalidade estatal e a intolerância política. “Nossa democracia tardia ainda não se libertou de algumas das mais perversas tradições do regime armado. As Comissões da Verdade investigam os casos de desaparecidos políticos da ditadura militar, mas de 2007 a 2013 nossa democracia conseguiu produzir, sem qualquer explicação, milhares de pessoas desaparecidas apenas no estado do Rio de Janeiro, em que pese a propaganda oficial afirmar que se trata de um território pacificado”. Breda também destacou o silêncio daqueles que desaparecem, retratado no espetáculo teatral “Murro em ponta de faca”,  de Augusto Boal, apresentado na noite do domingo (11) no Teatro do Paiol, dentro das programações do Mês do Advogado. “Mesmo que eu me cale, escutem. Mesmo que se calem todos, escutem o silêncio, o silêncio que fala”, diz um dos trechos do texto.
A representante da Comissão Estadual da Verdade, Neide Lima, falou da necessidade de participação da  juventude em audiências da Comissão da Verdade. “A juventude precisa compreender o que nós passamos para que isso não se repita mais”, comentou. Já Sueli Bellato, integrante do Tribunal de Justiça Restaurativa El Salvador, abordou a perseguição e repressão sofrida pela população do referido país em longo período de exceção e a luta para reparação dos danos. “O Tribunal é resultado do reconhecimento dos massacres e tira o silenciamento que foi imposto com  a lei de anistia de El Salvador”, afirmou. “É preciso ter criatividade para fazer justiça restaurativa. E o que as pessoas mais pedem é que os algozes e responsáveis pela repressão que ainda exibem patentes e recebem soldos do poder público deixem de receber esses benefícios”, comentou.
O juiz da Corte Interamericana de Direitos Humanos, Roberto de Figueiredo Caldas, falou da importância dos advogados na defesa da sociedade e da democracia e o dever de expandir a promoção dos direitos humanos. “As comissões da Verdade e da Anistia são importantes para o resgate da verdade, mas precisa ter investigação, processamento e punição dos responsáveis por crimes graves contra direitos humanos”, afirmou. Caldas também reforçou a necessidade dos advogados utilizarem no seu cotidiano os princípios da Convenção Americana de Direitos Humanos - o Pacto de San Jose da Costa Rica. “A convenção é uma espécie de Constituição dos direitos humanos, daí a importância da sua utilização pelos advogados já em petições iniciais”, salientou. Ele também lamentou a lacuna no ensino jurídico na área de direitos humanos.
Conforme Daniel Godoy, presidente da Comissão da Verdade da Seccional, a OAB Paraná foi uma das pioneiras em organizar o debate. “Hoje recebemos o Baltasar Garzón, jurista de renome internacional, com experiência em vários países do mundo em redemocratização, além dos representantes de Comissões da Verdade, da Anistia e do Fórum de Entidades de Defesa da Memória e Justiça”, avaliou Godoy.

PresençasA mesa de abertura do evento foi composta pelo presidente da OAB Paraná, Juliano Breda; pelo jurista Baltasar Garzón; por Sueli Bellato, do Tribunal de Justiça Restaurativa El Salvador; pelo juiz da Corte Interamericana de Direitos Humanos, Roberto de Figueiredo Caldas; pela integrante da  Comissão Nacional de Anistia, Caroline Proner; pela representante da Comissão da Verdade do Paraná, Neide Lima; por José Antonio Gediel do Fórum de Entidades em Defesa da Memória e Justiça, pelo presidente da Comissão da Verdade da Seccional, Daniel Godoy e pelo presidente da Câmara Municipal de Curitiba, Paulo Salamuni.

O evento ainda contou com a presença do reitor da Universidade Federal do Paraná, Zaki Akel Sobrinho; do presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da Seccional, Renato Kanayama; do presidente da Caixa de Assistência dos Advogados (CAA-PR), José Augusto Araújo de Noronha; das conselheiras estaduais Edni Arruda, Márcia Maluf e Luiz Fernando Casagrande Pereira; da diretora da CAA-Pr, Iolanda Gomes; do advogado Carlos Eduardo Manfredini Hapner; do representante da Comissão da Verdade da OAB Santa Catarina, Prudente Melo e da  Comissão da Verdade da OAB Minas Gerais, Cantino Duarte, além de ex-presidentes da Seccional e advogados.

Resgate da Verdade

Programação prossegue nesta quinta-feira (15), às 19 horas, com o painel sobre o tema “Amplitude da Lei da Anistia Brasileira: debates sobre a ADPF 153 e a decisão da Corte Interamericana de Justiça no caso Gomes Lund e outros”. Vão participar do debate Melina Girardi Fachin e Daniel Godoy Junior, ambos da Comissão da Verdade da OAB Paraná e Cristiano Paixão e José Carlos da Silva Filho, os dois da Comissão de Anistia. Na manhã de sexta-feira (16) a Caravana da Anistia se reúne da sede da Seccional a partir das 9 horas,  para julgamento de processos e reuniões de trabalho. 
Foto: Os integrantes da mesa de debate